Aracati

Tuesday, 07 August 2012 19:49

MERCADO PÚBLICO DE ARACATI (1860-1868)

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Mercado Público de Aracati-CE. Mercado Público de Aracati-CE. Acervo: Netinho Ponciano

A necessidade de se construir um novo mercado público em Aracati, já era um assunto discutido no ano de 1860. 

Num editorial do jornal O Aracati datado de 11 de janeiro de 1860, o articulista levantava a questão da construção de um novo mercado: 

  

É sabido que a casa do mercado que atualmente possui essa cidade é muito pequena e não está em relação com as necessidades do mercado, visto que lhe faltam todas as acomodações precisas e, além disto, está ela hoje tão deteriorada, que é para lamentar o seu estado de ruína. 

  

Baseado nos desenhos[1] do botânico Francisco Freire Alemão que aqui esteve com a Comissão Científica de Exploração em 1859, a casa do mercado ficava localizada no quarteirão ao lado norte da atual Praça Dr. Leite. 

  

Era pensamento que o novo mercado não fosse construído no mesmo local, pois o espaço não era apropriado sendo considerado pequeno e acanhado. Além do mais, havia uma parcela da população que defendia a demolição do mercado e no seu lugar fosse levantada uma praça para embelezar a principal rua da cidade (Rua das Flores) atual Cel. Alexanzito. 

  

A polêmica assumia caráter de debate. Havia os defensores que reconheciam que o local onde estava o mercado era muito favorável ao seu funcionamento devido a sua aproximação com rio Jaguaribe por onde chegavam os barcos trazendo as mercadorias para a comercialização. Outrossim, sua localização facilitava o desembarque dos produtos assim como a higiene e a limpeza do mesmo pelo favorecimento de jogarem tudo dentro do rio. Portanto, que se reconstruísse o novo mercado no mesmo local do antigo. 

  

  

As opiniões se dividiam. Existia uma grande porção dos moradores que advogavam a construção do novo mercado no lugar que estava destinado na planta da cidade para ser a Praça do Apolo, que ficava na então iniciante Rua do Rosário, mesmo tendo o inconveniente de ficar distante do ponto de desembarque das mercadorias e ainda ser necessário construir um esgoto ligando o novo mercado ao rio Jaguaribe para nele serem jogados “os ciscos e imundices provenientes do movimento do mercado”. 

  

  

Uma terceira corrente de pensamento patrocinava a ideia de que o mercado fosse assim dividido: No antigo mercado (Rua das Flores) funcionaria o açougue, e o mercado da Praça do Apolo ficaria para serem comercializados os gêneros alimentícios como farinha, feijão etc. Mas isso traria um incômodo para a população. 

  

Somente no ano de 1864, a demanda chegava então à casa da Câmara[2] que administrava a cidade, e tinha como seu presidente o Padre João Francisco Pinheiro. 

  

A localização do novo mercado público de Aracati, na Praça do Apolo, foi uma decisão tomada pela Câmara Municipal, com o argumento de que sendo um espaço amplo daria uma maior proporção ao mercado, além do mais a cidade deveria crescer “para aqueles lados do nascente”. 

  

Definido então onde deveria ser edificado o novo prédio, a Câmara Municipal enviou para o Governo da Província, um ofício em maio de 1864 pedindo permissão para a construção de um novo mercado público na cidade de Aracati. 

  

A resposta chegaria sete meses depois com a resolução nº 1148 de 07 de dezembro de 1864, a qual autorizava a Câmara Municipal a contratar serviços necessários para a edificação de uma nova casa para o mercado, “com quem por menos se comprometer fazê-la”. 

  

Como a Câmara não tinha no orçamento os recursos necessários para a edificação do novo mercado, o governo da Província autorizou à Câmara a contrair empréstimo desde que não “excedesse a doze contos de réis”. 

  

Foi mandado então se fazer uma planta do novo edifício e uma cópia do projeto foi enviada para o engenheiro da Província ao qual competia o parecer e aval de acordo com as especificações contidas nos regulamentos da Província. Os doze contos de réis estabelecidos pelo governo não foram suficientes para construção do prédio; o novo edifício exigia uma quantia muito superior àquela estabelecida pelo governo. 

  

 
Quebrando a regra ajustada, foi permitido então que a Câmara Municipal contraísse um empréstimo no valor de vinte e quatro contos de réis junto ao governo da Província para a execução da obra. 

  

Resolvida a questão financeira a Câmara Municipal abriu a concorrência para a construção do novo mercado. No dia 04 de maio de 1865, na Casa da Câmara em sessão extraordinária, perante o Presidente o cônego João Francisco Pinheiro e todos os vereadores, o senhor Antonio de Moura e Silva, se 

  

[...]propôs a contratar a obra da nova casa do mercado, que foi mandada fazer pelo artigo 45 da lei provincial nº 1148 de 07 de dezembro de 1864; e não havendo entre todos os concorrentes que aparecerão, segundo o convite, que se fez por edital, quem por menos fizesse deliberou a câmara que se aceitasse a sua proposta, que foi a quantia de vinte e cinco contos, trezentos e quarenta e sete mil réis, sujeitando-se, e obrigando-se as seguintes condições: 1º O edifício deve ser quadrado com duzentos palmos de cada face, tendo de altura da sapata ao cimo da cimalha vinte e oito palmos de conformidade com as posturas municipais. 2º O edifício deve ser guarnecido exteriormente com cal do Ceará ou de Lisboa, dando-se nesta a cor de amarelo oca. 3º As portas devem ser de cedro com treze palmos de altura, e polegada e meia de grossura. 4º Os portões serão de ferro com suas competentes bandeiras de ferro. 5º Os quartos devem ter vinte e quatro palmos de fundos, e os telheiros contíguos dez. 6º Todas as fechaduras que pedirem as portas serão de broca e as dobradiças de crús e dobradas. 7º As pedras para a soleira dos portões, e portas de entrada do edifício devem ser de cantaria bem barradas e inteiras. 8º O edifício deve ser pintado em todas as portas, colunas e grades com a cor de roxo terra a óleo de linhaça. 9º A obra contratada deve ser entregue a Câmara da data de hoje a vinte meses, sendo o contratante obrigado a multa de cinco contos de reis na falta de cumprimento do presente contrato. Finalmente o contratante fica obrigado a por alijares de cedro em todas as portas do edifício. 

  

O referido contrato foi assinado no dia 15 de maio de 1865 por todos os vereadores e lavrado pelo secretário da Câmara Bento José da Fonseca da Silva no Paço da Câmara Municipal de Aracati. 

  

Atendendo a solicitação enviada pela Câmara Municipal de Aracati- em 22 de junho de 1865- o engenheiro da Província, em correspondência oficial ao Presidente da Província, emitiu parecer favorável à realização da construção do mercado público informando as condições estipuladas no contrato estabelecido entre a Câmara e o Sr. Antonio de Moura e Silva. 

  

Em 1867 a câmara enviou um ofício ao Presidente da Província com os seguintes termos: 

  

Esta câmara prevendo quando 1º de janeiro do ano futuro terá de funcionar o novo mercado público desta cidade, visto como acha-se muito adiantado; querendo logo quando isto se der, tenha ele regulamento embora provisório, mas quando de logo firme essa direção os meios e conservação tem a honra de passar as mãos de V. Excia. 

  

Havia uma preocupação e pressa por parte da Câmara, pela aprovação do regulamento que iria reger o funcionamento do novo mercado. 

  

O apelo foi bem correspondido, pois a resposta do Presidente da Província foi rápida, comunicando que aprovava provisoriamente o regulamento para o novo mercado de Aracati, submetido, no entanto a consideração de que: “Às câmaras municipais cumpre não exorbitar ao que lhe é prescrito em seu regimento, e dar fiel execução as suas posturas competentemente”. 

Constava ainda neste documento a autorização, solicitada pela Câmara Municipal, para demolição do velho mercado da rua das Flores (Cel. Alexanzito) e leilão público do material resultante da demolição - tijolos, tabuas, madeiras, etc. 
 
O regulamento para o funcionamento do novo mercado de Aracati trazia algumas considerações interessantes ao olhar dos dias atuais, porquanto vejamos: 

  

Os contratos de arrendamento dos quartos não podiam ir além de quatro anos nem menos de um. 

O arrendatário tinha que ter um fiador que agradasse a Câmara. 

Os quartos de esquina do mercado do lado norte eram destinados para os que vinham de fora da cidade dispor a retalho gêneros alimentícios quais sejam: farinha de mandioca, goma, milho, feijão, arroz, rapaduras e frutas. Estes pagavam somente uma taxa para comercializar dentro do mercado. Os do lado sul como se achavam (segundo avaliação da Câmara) “melhormente colocados deviam ser arrendados ou arrematados”. 

  

Outras rígidas normas e considerações regulavam o funcionamento do novo mercado: 

  

Não era permitida a venda de carne verde ou seca fora do mercado público. 

Também não era permitida fora do mercado a venda a retalho dos gêneros alimentícios como farinha de mandioca, goma, milho, feijão, rapaduras etc. 

Os jogos de cartas quaisquer que fossem sua espécie eram inteiramente proibidos dentro do mercado. 

A ninguém era permitido lançar objeto dentro da cacimba do mercado, antes pelo contrário todos que ali fossem eram obrigados a respeitarem o asseio e conservação de suas águas. 

  

As multas aos infratores variavam entre pagamentos em dinheiro ou prisão - pelo menos cinco dias. 

Havia um policial exclusivo para o mercado que também exercia a função de fiscal. As obrigações desse funcionário eram: 

  

Abrir os portões do mercado às cinco horas e trinta minutos da manhã e fechar os portões às nove horas da noite; 

Examinar se todas as bancas estavam totalmente limpas uma hora antes de fechar o mercado e; 

Vigiar pela conservação e futura prosperidade das árvores plantadas em ambas as frentes do mercado, fazendo-as substituir no caso de definharem. 

 

  

Em ofício encaminhado ao Presidente da Província Dr. Antonio Joaquim Rodrigues Junior, a Câmara Municipal de Aracati comunicava que no dia 1º de junho de 1868, o novo mercado público de Aracati iria ser aberto à concorrência a todos aqueles que quisessem expor à venda seus gêneros alimentícios. O documento foi assinado pelo Presidente Padre João Francisco Pinheiro e os seguintes vereadores: Ivo Cassiano Pamplona, José da Silva Porto, Antonio Lemos Braga, Joaquim Monteiro da Silva, Manoel José Martins e Aureliano de Paula Martins. 

  

Todavia o prazo de vinte meses para a conclusão da obra não foi cumprido. A obra do novo mercado de Aracati demorou quase três anos para ficar totalmente pronta. 

  

Em visita ao Aracati no ano de 1884, o senador aracatiense Liberato de Castro Carreira, assim descreveu o que viu em sua passagem: “A antiga e pequena Rua do Piolho na direção da Matriz tinha se transformada em uma grande avenida, onde se achava o Magnifico Mercado Novo”.  

 


[1] Diário de Viagem de Francisco Freire Alemão 

[2] Ainda não havia a esse tempo a figura do Prefeito Municipal. O Presidente da Câmara exercia então essa função. 

 

Lido 1043 vezes Última modificação em Wednesday, 09 November 2022 21:21
Antero Pereira Filho

ANTERO PEREIRA FILHO, nasceu em Aracati-CE em 30 de novembro de 1946. Terceiro filho do casal Antero Pereira da Silva e Maria Bezerra da Silva, Antero cresceu na Terra dos Bons Ventos, onde foi alfabetizado pela professora Dona Preta, uma querida amiga da família. Estudou no Grupo Escolar Barão de Aracati até 1957 e, a partir de 1958, no Colégio Marista de Aracati, onde concluiu o Curso Ginasial.
Em 1974, Antero casou-se com Maria do Carmo Praça Pereira e juntos tiveram três filhos: Janaina Praça Pereira, Armando Pinto Praça Neto e Juliana Praça Pereira. Graduou-se em Ciências Econômicas pela URRN-RN em 1976 e desde então tem se destacado em sua carreira profissional.
Antero atuou como presidente do Instituto do Museu Jaguaribano em duas gestões (1976-1979/1982-1985) e foi secretário na gestão do prefeito Abelardo Gurgel Costa Lima Filho (1992-1996), responsável pela Secretaria de Indústria, Comércio, Turismo e Cultura.
Além de sua carreira profissional, Antero é conhecido por seus estudos sobre a história e a memória da cidade e do povo aracatiense, amplamente divulgados em crônicas e artigos publicados na imprensa local desde 1975. Em 2005, sua crônica "O Amor do Palhaço" foi adaptada para o cinema em um curta-metragem (15") com direção de seu filho, Armando Praça Neto.

Obra

Assim me Contaram. (1ª Edição 1996 e 2ª Edição 2015)
Histórias de Assombração do Aracati. Publicação do autor. (1ª Edição 2006 e 2ª Edição 2016)
Ponte Presidente Juscelino Kubitschek. (2009)
A Maçonaria em Aracati (1920-1949). (2010)
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