POETOSSÍNTESE

Wednesday, 28 July 2021 10:46

FRANCISCO MONTEIRO DE SOUZA

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FRANCISCO MONTEIRO DE SOUZA Francisco Monteiro de Souza

Seleta de poemas escritos por Francisco Monteiro de Souza.

POEMA EMPOBRECIDO 

  

No mundo dos poetas, eu nunca chego a morar 

Mesmo sendo um escritor na estrada dos poetas 

Eu não consigo andar, eu sou um mártir sofrido 

Mesmo sem dívida a pagar só porque sou analfabeto 

  

Nem sequer eu sei falar, se eu fosse um doutor 

Só o peso do meu nome me levaria ao primeiro 

Ou ao segundo lugar 

  

Meu poema é tão pobre preço é tão pequeno 

Nunca consegui vender nunca vi ninguém comprar 

Meu poema é muito humilde não pode se exaltar 

Se exaltar se humilha fica ao mundo do Deus dará 

Meu poema é noite escura sem raios de luar 

Meu poema é fim de inverno os caldeirões secando, 

Sem água para se banhar 

  

Meu poema é o sol nascer trazendo mais um dia 

Pra eu viver para o meu poema falar 

Meu poema é bonito até a sereia sai de dentro do mar 

Fica na beira da praia sentada na areia vendo 

Meu poema cantar, 

  

Meu poema faz eu chorar, meu poema me seduz 

Ajuda só de Jesus, que me acende uma luz 

E me bota na mesma estrada que eu vejo os poetas 

Andar. 

  

Francisco Monteiro de Souza in Martírio de um analfabeto. Francisco Monteiro de Souza. Publicação do autor. (1990?) 


 

RECANTO DE UMA FONTE 

  

  

Estou em um recanto de uma fonte, aguando o meu jardim 

Falando das coisas do mundo, sem falar um pouco de mim. 

  

Vendo as rosas brotar e os versos do meu poema 

Flutuando sobre o ar 

E a natureza se encarrega de juntar 

Os meus poemas e aos restos mortais da Índia Iracema 

E da história de José de Alencar 

E esta fonte tão cheia e tanta água sobrando 

E a minha fonte secando, que são os meus olhos de tanto chorar 

  

Chorar porque não vejo a verdade 

Chorar porque só vejo a maldade 

E as minhas lágrimas descem para cair no chão 

Eu não deixo cair e aparo nas palmas das minhas mãos 

E levo à minha boca como que seja um cálice 

Que eu tenha que tomar. 

Essas lágrimas que são essas águas que sustentam meu corpo 

E não deixa a fonte secar, 

Essas águas que aguaram todos os dias 

Esses dois pés que eu pranto no chão 

Que anda atrás da verdade, atrás da certeza 

Atrás dum pão para me alimentar 

Atrás de Jesus pedindo para me salvar 

Jesus, não deixe minha fonte secar 

Se esta fonte secar meus pés morre 

Morre uma história, morre quem aqui está. 

Meu deus não deixe minha fonte secar... 

  

Francisco Monteiro de Souza in Martírio de um analfabeto. Francisco Monteiro de Souza. Publicação do autor. (1990?) 


 

MINHA HISTÓRIA 

  

Se a minha história é mentira eu vou parar de falar, o rico fala usa e abusa, eu vejo o povo aplaudir, eu vejo o povo abraçar, eu sei que a minha história é muito pobre, mas dá pra se aproveitar. 

  

Minha história faz parte da escritura sagrada que eu vi Jesus pelas ruas publicar, este Jesus que deu aula aos doutores este Jesus ensinou este analfabeto poeta escrever sem ter caneta falar sem ninguém ensinar. 

Minha história é uma justiça correta ao crime condenar é o amor do seio de uma mãe ao filho amamentar, é o riso de uma criança são os olhos a chorar. 

Minha história é a cama da humildade aonde a minha velhice e a minha doença se deitam pra descansar, eu velho, sofrido e cansado com meus ombros enfadados de carregar uma enxada para o mato capinar, é a sede e a pobreza no desespero da vida atrás de ganhar o pão pra dor da fome matar. 

Minha história é a verdade é o amor, é uma rosa é uma flor que nasceu de uma árvore que morreu que eu vi a seca matar, é a cruz do meu rosário nos meus ombros debruçados eu de frente ajoelhado pra meus mistérios rezar. 

Minha história são as belezas da natureza que eu vejo no céu brilhar, seja a lua seja as estrelas é o início do dia é o nascer para o mundo clarear, é um galo cantando eu sentado em minha cama rezando uma ave-maria pra poder me levantar. 

Minha história é eu sentado nos bancos da praça da fantasia, ali quem estava um poema me pedia e os políticos lendo os jornais com as manchetes do dia e bondade que até Jesus repudia, e eu olhava para um lado e para o outro só via fome, miséria e pobreza do centro às periferias, ali eu vejo nas palhas das palmeiras os ventos fortes assovia os passarinhos cantando como fosse uma sinfonia e os meus amigos chegando alguns deles me abraçando e outros um autógrafo me pedia. Mas tinha caneta e papel, mas eu era um analfabeto nada ali eu escrevia, dei um autógrafo com o meu dedo lá no manto de Maria, ali nós se ajoelhava e beijava e os ventos fortes levava os poemas que eu dizia. 

Palavras de Chico Monteiro. 

  

Francisco Monteiro de Souza in Martírio de um analfabeto. Publicação do autor. (1990?) 


 

Lido 385 vezes Última modificação em Thursday, 17 November 2022 20:52
Francisco Monteiro de Souza

Francisco Monteiro de Souza- poeta aracatiense.

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